O flâneur e a atitude blasé - Parte II


A atitude blasé é consequência do excesso de estímulos que recebemos por viver na cidade. Simmel acreditava que a atitude blasé tinha duas fontes: os estímulos contrastantes impostos aos nervos e a dificuldade em discriminar. Estes estímulos contrastantes são o excesso de imagens, informações, pessoas, coisas, atividades e tudo o que perpassa pela vida urbana. O autor acrescenta, também, “uma vida em perseguição desregrada ao prazer” e a “intensificação da intelectualidade metropolitana”. 

Ficar blasé é a mesma coisa de ficar anestesiado, mas por causa de tantas incitações que recebemos. Por causa desta atitude não vemos diferenças entre a importância de uma coisa ou outra e não temos energia suficiente para reagir contra ela. Simmel diz que os objetos são percebidos, mas “o significado e valores diferenciais das coisas, e daí as próprias coisas, são experimentados como destituídos de substância”. As coisas para a pessoa blasé surgem em um “tom plano e fosco; objeto algum merece preferência sobre outro”. 

A atitude blasé me parece comum nos dias de hoje. Simmel publicou o estudo sobre a vida na metrópole e os estímulos em 1902. 110 anos de diferença, e não vejo diferença alguma. Estamos tão blasé que nos parece comum a violência, os engarrafamentos, os lugares extremamente cheios e confusos, a concrete jungle. Para mim, a atitude blasé passou a chamar estresse e viver na cidade nos deixa estressados. O estresse não permite perceber, experimentar o lugar em que vivemos e por isso, o flâneur (que existia ou existiu dentro de cada um de nós) desaparece. Simmel diz que a criança que nasceu na metrópole nasce blasé. Não discordo. 

O flâneur precisa voltar, não para ser o burguês com tempo de sobra, mas para permitir que apreciemos o que está à nossa volta. Percebo como nós, metropolitanos, temos pouca paciência para o interior, para a roça, para o lugar silencioso. Não me sinto à vontade sem estímulos, sem sons, sem imagens.  O calmo, o tranquilo parece entediante. E isso também acontece na cidade. Os monumentos, os espaços, as coisas estão lá, para serem vistas, vivenciadas e passamos, passamos por elas porque não temos tempo, não há tempo para flanar. A pressa da cidade atrasa tudo, até mesmo a percepção humana.

Lendo Simmel e Benjamim podemos ver a aproximação dos pensamentos de ambos com nossa vivência, hoje. Não sei se estes autores são atemporais ou se não evoluímos ao longo de todos estes anos. O que mais gostaria é que pudéssemos ser como a figura de Paris, que aprecia, observa e vai contra o fluxo e que não estivéssemos tão blasé. Isso tudo é só para refletir: a atitude blasé matou o flâneur?

Referência:

Simmel, George. A metrópole e a vida mental. IN: Velho, Guilherme Otávio. O fenômeno urbano. 3ª edição. Zahar Editores: Rio de Janeiro.

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